06 maio 2011

Sessão de autógrafos na Feira do Livro de Lisboa

Amanhã, dia 7 de Maio, estarei na Feira do Livro de Lisboa, das 15 às 17h, para sessão de autógrafos no pavilhão da Presença.
O romance "O Homem que Viveu Duas Vezes" é livro do dia.

Parece que amanhã vai chover e até é possível que "granize". Não esmoreçam, apareçam nem que seja apenas para vos conhecer.

E a ideologia, pá?!

Afirmações do último mês:

a) A equipa da troika é constituída por técnicos das três instituições;

b) O plano para cumprir é um plano técnico;

d) Francisco Assis (que considero um dos mais clarividentes políticos) afirmou que agora não interessam ideologias, mas sim cumprir o plano;

e) A margem de manobra política dos partidos (e da sociedade) é muito reduzida se não nula;

f) Camilo Lourenço, “Uma equipa de técnicos fez em três semanas um programa de Governo que os partidos não foram capazes de fazer durante anos” (podemos se calhar privatizar o Governo).

A mensagem que perpassa do que temos ouvido nos últimos tempos é que podemos “brincar” à política e aos políticos desde que exista dinheiro, que as finanças públicas e privadas estejam de boa saúde. Ou seja, a economia tem primazia sobre o político e a ideologia. Só que esta ideia (reparem na palavra) é ela própria o resumo de uma ideologia: a capitalista. (não comecem já a pensar coisas, sou a favor da ideologia capitalista).

Mas sendo a melhor definição de Homem conseguida até hoje a que nos chega da Antiga Grécia - é um animal político, social e sociável (não refere económico) -, recentremos então a análise.

Em crises mundiais e nacionais anteriores (de um modo simplista podemos dizer) à falência ou degradação de um sistema era possível contrapor outro alternativo, sem que a nova opção fosse necessariamente melhor: república à monarquia, comunismo/socialismo ao capitalismo (entendido como modelo de sociedade), democracia à ditadura. Hoje, pela primeira vez, à crise do capitalismo não há ideário de fuga. Os filósofos, os intelectuais não têm produzindo pensamento que permita vislumbrar uma sociedade baseada em pilares diferentes dos do capitalismo, mesmo que se revelassem meras utopias. A última deriva terá sido de Alvin Toffler com “A Terceira Vaga” em que as tecnologias da informação e comunicação (produzidas pelo capitalismo) nos conduziriam ao paraíso na terra, com mais horas de lazer, com maior produtividade, com mais riqueza para distribuir.

Hoje, às crises do capitalismo o que se contrapõe são melhoramentos à ideologia capitalista política e económica. Só que uns, os neoliberais, são adeptos do capitalismo, mais ou menos selvagem, em que o mercado é rei e senhor olhando o sistema fundamentalmente do ponto de vista económico; outros, os socialistas democráticos ou social-democratas, abraçam o capitalismo popular, perspectivando capitalismo como sistema social e político.

Como qualquer iniciado à Economia Política aprende as transacções, a realização de mais-valias e a acumulação de capital (que pode ser conseguida pela força das armas) fazem parte da natureza humana desde que o homem aprendeu a produzir para além das suas necessidades de consumo e que passou a relacionar-se inter-grupos. O que este sistema tem de perverso é que não é um sistema de vasos comunicantes em que o fluído tem a tendência a equilibrar o nível em todos os vasos, é antes um buraco negro em que a concentração de massa (capital) tende a atrair a si toda a massa (mais capital) que caia no seu campo gravitacional. E essa perversidade traduz-se para os neoliberais em que os pobres são os culpados de serem pobres e para os social-democratas que os pobres têm possibilidade de virem a ser remediados ou ricos.

Aqui entra o primado do político sobre a economia em que o sistema necessita de ser balizado (evito o regulado) por um conjunto de valores e que as regras da sociedade tenham em conta: justiça, solidariedade, etc

Portugal nunca esteve fora (mesmo no período das nacionalizações), e bem, da economia de mercado (economia socialista de mercado não existe); Portugal pertence a organizações internacionais que adoptam este sistema político e económico; Portugal solicitou intervenção de três instituições que são bastiões do sistema capitalista. Isto é uma opção ideológica (pá!) não é uma opção técnica ou uma inevitabilidade de qualquer outra índole.

O plano de recuperação financeira do país é, pois, iminentemente ideológico no sentido que dita, digo eu, que se tenda mais para o lado dos neoliberais do que para o lado dos socialistas democráticos. E é tanto mais ideológico quando não se limita as aspectos puramente técnicos e refere, por exemplo, a reforma da Justiça, entre outras.

Qualquer partido ou conjunto de partidos que venham a governar Portugal será obrigado a fazê-lo de acordo com o contrato que for assinado, mas não podem suspender a ideologia durante três anos. A ideologia está lá e há que aperfeiçoá-la e construir mecanismos políticos e económicos que permitam melhorar efectivamente a vida de todos os portugueses.

It's not the economy, stupid. É a ideologia, pá!

03 maio 2011

Auto-entrevista do escritor Carlos Machado

AUTO-entrevista


1. Os teus dois romances, “O Homem que Viveu Duas Vezes” e “Um Amor Sem Tempo, remetem para uma época imediatamente pós-25 de Abril com referências muito específicas a factos políticos. Podemos dizer que são prosa militante ou engajada?


Não. Em ambos a pretensão é a de passar a escrito para memória futura a cultura, os vocábulos, os locais de um mundo rural num determinado instante importante para o país porque momento de ruptura e transformação, bem como os pensamentos/sentimentos das pessoas que viveram essa época em locais afastados dos meios citadinos onde a Revolução se manifestava na sua plenitude.


2. São livros autobiográficos?

Essa é a pergunta inevitável e obrigatória. Posso dizer que evitei colocar-me, nem que fosse como figurante, em qualquer dos romances. No entanto um escritor de ficção inevitavelmente recorre ao seu manancial de experiências. Eu diria que inclusivamente os livros de antecipação científica, de vampiros ou de mundos fantasiosos são autobiográficos porquanto serão baseados em desejos ou medos do autor. É evidente que as histórias dos meus livros contém alguns episódios e sentimentos vividos por mim, mas completamente desinseridos do contexto o que lhes retira essa carga de autobiografia.


3. Então, para além do repositório para memória futura, de que tratam?

Começo por dizer que nunca iniciei qualquer escrito pretendendo contar uma história. Pretendo antes tratar de um tema, - “O Homem que viveu duas vezes” é sobre a identidade das pessoas, da época, dos locais; “Um Amor Sem Tempo” é precisamente sobre a noção de tempo e de um sentimento, a vingança, que é o único que se fortalece com o passar do tempo enquanto todos os outros se desvanecem. O tema é o esqueleto que suporta toda a obra e a história, as estórias, são os músculos e a pele que revestem esse esqueleto. E com base neste paralelismo com o corpo humano, convido os leitores a autopsiarem os meus romances retalhando-os, explorando-os de modo a encontrarem o esqueleto.

4. …
Ah, antes de continuar. São também um tributo às mulheres, a todas as mulheres, e voltando ao aspecto autobiográfico, mais uma vez tem por base a força, a coragem, a clarividência, a generosidade das mulheres da minha vida e do amor que me devotam. Quer n’ “O Homem que viveu duas vezes”, quer n’ “Um Amor Sem Tempo” são as mulheres a força motriz da acção.


5. Começaste a publicar aos 53 anos, é no entanto um escritor recente, consideras-te inserido nos novos narradores portugueses?

Não só a publicar. A escrever. Quanto à catalogação não depende de mim, depende dos críticos, que não lêem os meus livros. Porém, não estou demasiado preocupado com esse tipo de classificação, nessa ou noutra qualquer categoria. Importa-me algo bastante mais simples, mas muito mais difícil: se sou bom ou mau escritor.


6. Nota-se um certo ressentimento com a crítica.

Apenas referi a crítica porque é ela que, bem ou mal, faz a catalogação. Não sei se hei-de chamar ressentimento. Aliás, sei que não hei-de chamar porque eu sinto ressentimento quando algo me é dito que funciona de determinada maneira e depois funciona de modo diverso. Não é o caso. Eu sabia à partida como funciona o mundo dos livros. É como todos os mundos um mundo que gira à volta de si mesmo e é extremamente difícil penetrar no inner circle visto haver uma força centrípeta que repele os corpos estranhos.
Caso sintomático é o nome do meu blog: pro(e)scrito


7. Estás a falar por parábolas para não seres marginalizado.

Se assim julgas posso ser mais específico: a indústria livreira vive da venda de livros e promove os autores que acha rentáveis e todo o sector - meios de comunicação, críticos, editores, livreiros, festivais, conferências - apostam na exploração do filão. Quando alguém grita ouro, todos acorrem. Sobre mim nunca ninguém gritou essa palavra mágica, só não sei se é por não ser uma pepita ou se por ainda não terem garimpado no meu campo.
Falta em Portugal agenciamento de escritores. É um trabalho que, por vezes, é feito pelas editoras, mas não sendo este o seu foco, não o fazem de modo profissional.


8. O autor, ele mesmo, como se classifica?

Se está a perguntar se me considero bom ou mau, respondo do seguinte modo: escrevo em português escorreito, mas sou um mau escritor porque não consigo escrever aquilo que quero. Por exemplo, já tentei e ainda não sou capaz de escrever um romance de 400 ou 500 páginas de qualidade, uma peça de teatro, ou um conjunto de contos. O bom escritor é aquele que faz o que quer com e das palavras. Eu ainda não consigo.


9. E o público leitor que papel desempenha no teu processo de escrita? Há autores que dizem que enquanto escrevem os leitores lhes são indiferentes.

Seria necessário saber o que é cada um deles pretende dizer exactamente com o público não lhes interessa. A mim importa-me porque é a minha única referência, para além da opinião de alguns amigos, sobre aquilo que escrevo e porque gostava que o meu meio de subsistência fosse a actividade literária. No entanto ainda não me dei conta de fazer concessões apenas para agradar e definitivamente não faço concessões do tipo encher páginas com descrições e diálogos bacocos que nada interessam ou com historietas lamechas.


10. Mas, ambos os romances são histórias de amor…

São histórias de relações humanas e as histórias de amor mulher/homem não são necessariamente lamechas, a não ser assumidas como as cartas de amor do Fernando Pessoa. Se repararmos a maioria dos grandes romances se não são sobre, têm uma história de amor como pano de fundo. Hitchcock resumia o ponto de partida de todos os filmes a: a boy meets a girl.


11. Se tem em atenção o público quando escreve o que é que pretende transmitir-lhe?

Os meus livros são consciente e tentativamente amorais, com um fim não completamente em aberto, mas não completamente fechado, isto para que o leitor construa a sua própria história a partir do que lê. O que é fundamental é a recriação do ambiente físico, emocional em que a acção se desenrola feita de tal modo que o leitor se sinta presente nesse ambiente como espectador, mas sinta que a qualquer instante podia nele participar. Pelos comentários que tenho colhido julgo ter conseguido estes desideratos.


12. Tens facilidade em escrever? Como é o teu dia de trabalho?

O segundo romance apanhou-me numa época de grande actividade profissional tendo pouco tempo para dedicar à escrita, o que levou a que houvesse um grande hiato entre os dois romances. Hoje tenho mais tempo para escrever, escrevo todas as manhãs, outras vezes o dia inteiro, no entanto sou pouco organizado na construção da obra, ando para trás e para a frente, muitas vezes perdendo eficácia e sobretudo perdendo homogeneidade na obra havendo partes muito bem conseguidas e outras que não o são tanto mais por falta de disciplina do que por ausência de capacidade. Ao mesmo tempo que escrevo leio muito e sou influenciado pelo estilo de escrita dos autores que estou a ler no momento reflectindo-se em estilos narrativos diferentes ao longo do texto. O livro é homogeneizado no fim o que me dá um trabalho imenso chegando ao cansaço físico.


13. Porque resolveste “dar” esta auto-entrevista?

Porque não havia meio que me fizessem estas perguntas.

(Entrevista realizada a 3 de Maio de 2011 em casa do escritor a partir do PC do escritor)

02 maio 2011

O fim de Bin Laden

Nunca me regozijarei com a morte de um ser humano, muito menos se essa vida termina às mãos de outro ser humano, mas a morte de Bin Laden não é a morte de um homem é o fim de um mito com o qual urgia terminar por toda a carga simbólica que carregava.

Bin Laden não terá tido a menor intervenção no recente atentado no Café Argana (onde estive muitas vezes com familiares e amigos) em Marraquexe; não sei se Bin Laden foi ou não o responsável pelos ataques do 9/11; não sei que efectivo poder tinha dentro da Al-qaeda, visto esta organização ser composta por células autónomas. Pouco me importa. O que me interessa é que a figura simbolizava o heroísmo da mais abjecta forma de luta - o terrorismo - por uma causa e a incapacidade dos atingidos (apenas o mais poderoso país do mundo, entre outros) em se defenderem; o que me interessa é que a morte do considerado ideólogo, financiador e dirigente da Al-Qaeda deu por findada essa ideia de impunidade.

No entanto, o terrorismo, nomeadamente o da Al-Qaeda, já conseguiu um nefasto desiderato (que possivelmente nem estaria, nem está no seu horizonte) que atinge um dos mais valiosos valores (o pleonasmo é propositado) das sociedades modernas que é o da privacidade da vida dos cidadãos e do qual estes estão de livre vontade dispostos a abdicarem por temor a ataques terroristas. E o pior é que essa justificação pode ser vir de cobertura para outras acções que nada têm a ver com terrorismo.

Teoriza-se já sobre as consequências desta acção: se o facto da sepultura no mar pretende esconder um corpo que não é o de Bin-Laden, ou se a morte do lidere da Al-Qaeda leva à desagregação da organização com o desaparecimento do homem ou ao recrudescimento do terrorismo com o nascer de um mártir. São sem dúvida aspectos importantes da questão porque não são de descurar quaisquer hipóteses no combate ao terrorismo, pois não sabemos quando algum de nós não poderá estar na hora errada no lugar onde pretendia estar em segurança.

Teria sido melhor capturá-lo vivo e julgá-lo? Talvez. Mas o julgamento recairia apenas na sua responsabilidade como mandante dos ataques às Torres Gémeas, ao Metro de Londres, à Estação de Madrid, ao Café de Casablanca e outros e não o julgamento e penalização do terrorismo.

Pelo que fica dito considero que esta actuação das forças especiais dos Estados-Unidos foi daquelas em que vestiram as “gabardinas claras dos good guies”.