25 agosto 2011

John Updike e o imposto sobre os ricos

Um dia o doutor Passos Coelho pediu desculpa aos portugueses por ter acordado com o Primeiro-Ministro de então que não haveria aumento de impostos, e este, à sua revelia aumento-os; depois, em campanha eleitoral -
Corre, Coelho
- afirmou que o saneamento das contas públicas se faria pelo lado da despesa - contendo-a, diminuindo-a - e não pelo lado da receita, porque sabia muito bem onde cortar nas gorduras do Estado; depois, já como Primeiro-Ministro -
Coelho, Redux
presenteou os portugueses com um imposto extraordinário, sugando-lhes metade do subsídio de Natal por causa de um desvio colossal que nunca explicou; depois, o Primeiro-Ministro foi para férias -
Coelho em paz
; depois, em férias, deve ter sido informado que os ricos nos Estados-Unidos e em França "queriam" pagar mais impostos e que França, Itália e Espanha vão aplicar impostos extraordinários aos mais ricos; depois o Primeiro-Ministro aparece, hoje, na televisão a declarar que para a semana vai tratar do assunto para Portugal.

A hipocrisia não tem limites e efectivamente há quem queira estar sempre de guarda ao pote. Então se eram necessários mil milhões de euros para acorrer ao buraco, e se é possível agora arrecadar essa quantia com um aumento de 7% sobre as dezasseis maiores fortunas nacionais (contas da TVI), porquê ir pelo caminho mais fácil e penalizar primeiro todos os outros assalariados para além do senhor Américo Amorim.

O doutor Passos Coelho poderá um dia completar a tetralogia de John Updike com
Coelho está Rico
, mas não sei se algum dia poderá ambicionar ao
Coelho,recordado
pelas melhores razões.

24 agosto 2011

Eu sou contra o TGV e pelo comboio a vapor

O Álvaro Ministro (sigo a vontade do próprio tratando-o pelo primeiro nome, mas o respeito é muito bonito e senhor sempre é um Ministro da Nação), foi na semana passada a Madrid, a exemplo de Luís Filipe Vieira, para negociar o TGV. Se seguisse o exemplo de Pinto da Costa, eles, os espanhóis, que batessem a cláusula da rescisão do TGV para Portugal desistir dele, ou então nada feito.

O que mais espanta na viagem-relâmpago à capital vizinha foi o titubear do Álvaro Ministro quanto ao "faz-se", "não-faz-se" a alimária que iria, ou irá consumir milhões de euros, quando se sabe que este Governo foi escolhido, entre outras coisas, para que o TGV não se fizesse. O senhor Álvaro Ministro diz que precisa de estudar. Sendo um académico de nomeada em país de grande riqueza, está-lhe na massa do sangue enveredar pelo estudo. Pergunto, porque o senhor não explicou, estudar mais o quê?

O TGV não se justifica pela mais ponderosa das razões: deixariam de se poder captar aquelas fabulosas imagens de cinema da Anna Karenina envolvida no vapor de uma máquina fumegante, a não ser que a máquina do TGV traga incorporado o lançamento de fumos tipo discoteca; ou o comboio a aproximar-se lentamente, largando o vapor, enchendo o écran, na "Manhã Submersa"; ou a espera inquietante d' "O Comboio Apitou Três Vezes", já que o TGV não pára em apeadeiros; ou o comboio, sempre a vapor, a atravessar a estepe russa coberta de neve no "Doutor Jivago"; tantas e tantas cenas ferroviário/cinematográficas que seriam impossíveis se os TGV pululassem por aí, sem esquecer que em "Tão Amigos que nós éramos" seria irrealizável a cómica, impagável, digna dos irmãos Marx, cena das estaladas numa estação aquando da partida de um comboio (não tenho a certeza, mas julgo que este era eléctrico).

Na mesma senda das declarações de Álvaro Ministro, sem titubear, Carlos Moedas Secretário de Estado, ontem, na Assembleia da República, respondeu a todas as dúvidas da execução orçamental...não respondendo (segundo a peça da SIC Notícias). Provavelmente terá de ir estudar porque apresentando apenas aquele gráfico que mostrou, é chumbo pela certa.

Senhor Álvaro Ministro, e demais colegas de Governo, os portugueses votaram em que tinha imensas certezas, em quem detinha a verdade que os iria salvar da amargura e da miséria, em quem tinha no seu seio nomes afamados no mundo da economia e das finanças e que iam acalmar, se não mesmo subjugar, os mercados, por isso exige-se que actuem não seguindo apenas o contrato com a troika. Caso contrário, os portugueses, parece, preferem ficar a ver passar os comboios.

23 agosto 2011

Bem-aventurados os que só têm quatro canais generalistas, pois deles será o reino dos Céus.

Passe-se uma semana em zona de veraneio em casa com televisão só com canais de sinal aberto e facilmente se intui que se Cristo voltasse à Terra o Sermão da Montanha teria de ser actualizado. No conhecido sermão Cristo oferece a todos os desafortunados e sofredores terrenos um bem maior na vida eterna do que o que à partida está reservado aqueles que nesta vida são cumulados de benesses e riquezas.

Provavelmente rezaria assim:
Bem-aventurados os que só podem ver o Goucha, a Júlia Pinheiro, o Carlos Alberto Moniz, o Jorge Gabriel, a Fátima Lopes; bem-aventurados os que só têm para ver telenovelas sempre iguais e concursos destinados a humilhar os concorrentes; bem-aventurados os que só podem escolher entre filmes do Van Damme, Vin Diesel e Steven Segal; bem-aventurados aqueles que são perseguidos por séries de desenhos animados japoneses; bem-aventurados os que levam com as séries dos C.S.I., Investigação Criminal de seasons (é assim que se diz, não é?) fora de época.
Alegrai-vos e regozijai-vos, porque será grande a vossa recompensa na RTP2 (que já teve muito mais qualidade do que tem hoje).

Durante uma semana, em dois canais de sinal aberto públicos que merecesse ser visto, para além de poucos minutos dos noticiários, apenas se aproveitou um documentário sobre a Terra (tipo BBC)no segundo canal.Todo o resto, uma inigualável miséria franciscana, sendo certo que os Franciscanos são pobres por opção e não têm déficite (e tu, ó intelectual da treta, ó snob, está calado, se não gostas, não comas).

Dir-me-ão que as férias são os períodos que aproveitamos para fazer outras "coisas" e para deliberadamente não fazermos algumas "coisas", como ver televisão. Mas a RTP não "mete" férias, todos os meses me cobra uma taxa de difusão (na factura da EDP) tenha ou não tenha aparelhos receptores, e ao longo do ano mantém uma programação idêntica polvilhada com uns debates, e brinda-me com umas transmissões directas de touradas e do jogos de futebol que ajudo a pagar com os meus impostos. É isto serviço público? Não, e se é para continuar com esta programação, não há que hesitar, privatize-se a RTP, porque caso se privatize o canal 1, a diferença será apenas no regresso das telenovelas ao canal-mãe e aumento dos espaços publicitários.

Há apenas que definir Serviço Público de Comunicação Social. E nomeada que está uma Comissão presidida pelo Dr. João Duque (minimalista dos serviços públicos) esta tem apenas que superar as seguintes provas de redacção:
1 - Definir um Serviço Público de Televisão que encaixe na RTP e não o oposto;
2 - Ao contrário de outros serviços públicos, água, electricidade, vias rodoviárias e ferroviárias,etc, em que a exigência dos consumidores vai no sentido de uma maior qualidade, no serviço público de comunicação social as direcções da vontade da esmagadora maioria do público e do que se pretende (?) seja a nobreza (?) do serviço público, se não são opostas, são bastante divergentes.

Não me parece um trabalho de grande monta esta tarefa da Comissão, é um trabalho à partida facilitado porque não há nada para inventar que não esteja já inventado. E, para que a sua tarefa fosse verdadeiramente aligeirada falta-lhe apenas ter Jesus Cristo como membro com a incumbência de prometer uma televisão generalista melhor...no Reino dos Céus.