22 julho 2011

Ó desvio colossal, sai da frente!

Na passada semana o país foi surpreendido, se é que foi, por um desvio colossal no déficite das contas públicas. Na mesma semana o Ministro das Finanças vem explicar como é que vai ser aplicado aos portugueses um roubo "colossal" e aproveita a conferência de imprensa para fazer um apurado sketch de mímica (vejam o vídeo sem som) a explicar o que é que afinal o "colosso" adjectivava.
Os mediáticos do PSD, afirmando que o valor do tal déficite era de 2,3 mil milhões de euros, apareceram a desmentir o senhor Ministro das Finanças que dissera que o acréscimo do déficite era da ordem dos 1000 milhões de euros.

Esta semana correu bastante melhor. O senhor Primeiro Ministro, a partir de Bruxelas, acertou na interpretação do senhor Ministro das Finanças e no valor de derrapagem do déficit. É particularmente feliz a expressão do senhor Primeiro Ministro, "como todos os portugueses já perceberam não há um desvio colossal..."

Entre os dois eventos atrás relatados, criou-se um facto com um vídeo no Youtube, "Ó Guedes, sai da frente", com a finalidade de o número de visitas ser batido pelo visionamento do vídeo que hoje foi divulgado mostrando que o senhor Primeiro Ministro só fala verdade. Dá o vídeo pelo nome "Ó desvio colossal, sai da frente"

18 julho 2011

"PASTORAL AMERICANA", de Philip Roth, D. Quixote

De há alguns anos a esta parte Philip Roth é um permanente candidato ao Prémio Nobel da Literatura. Como se sabe são insondáveis os desígnios do Senhor e os critérios da Academia Sueca atribuição do dito galardão. Embora, Roth não fosse escritor que me entusiasmasse, está a milhas de distância (à frente) de outros escritores já distinguidos com o Nobel.

Na semana que findou li "Pastoral Americana" e fiquei rendido. É um portentoso romance.

A leitura e análise superficiais remetem-nos para a concretização do "sonho americano" por um judeu, Seymour Levov, que vê esse ideal ser destruído pelos entes familiares que lhe são mais próximos e queridos. Um homem, singra na vida e tem tudo o que lhe é imaginável alcançar: beleza física -sua e da mulher -, êxito nos três desportos que pratica, reconhecimento nos Fuzileiros, uma filha que adora e que tem um "pequeno" problema de gaguez, e sucesso nos negócios que herdou do pai. Para tanto, bastou-lhe acreditar na América e na prossecução dos padrões de fazer sempre o que está certo.
Mas, Philip Roth não se limita a uma história banal de ascensão e queda, vai ao fundo do "sonho americano" mostrando que esse sonho encerra dentro de si a sua própria substância e o seu contrário (não são assim todos os organismos, sistemas, ideais?), contém no seu seio os gérmenes da sua própria destruição. E o romance, feito de inúmeros argumentos e contra-argumentos, de infindáveis sequências de perguntas, cujas respostas são novas dúvidas, conduz-nos ao problema fundamental: o "sonho americano" não se confina ao sucesso económico-financeiro, passa pelo sucesso do indivíduo como homem perfeito com sucesso em todas as actividades e muito especialmente na família. A sua família também tem de ser uma família de sucesso, sem pecado, sem mácula. E é por aqui, pela família, que o Sueco, Levov, vê ruir todas as suas ilusões.

Se a América é vista com a terra das grandes oportunidades e o "sonho americano" se materializa sobretudo pelo sucesso económico, a pastoral americana, idílica, é mais falível pelo lado dos valores morais e espirituais, do que pelo lado do dinheiro.
Um livro publicado em 1997, mas muito actual para nos questionarmos sobre os valores que nós europeus, nós portugueses queremos adoptar. O "sonho americano", como ideologia (o discurso da tia da mulher de Levov para convencer o pai a deixá-la concorrer a Miss América é paradigmático e espectacular),o bem-estar económico que se pressupõe ser o sustentáculo de toda a felicidade podem ser o motor da economia, mas podem destruir os homens "bons" como o Sueco, Levov.