06 julho 2012

Cada vez percebo menos

Como trabalhador do sector privado, a decisão do Tribunal Constitucional sobre o corte dos subsídios da Função Pública não me podia ser mais desfavorável, na perspectiva de ser novamente sobretaxado. Como democrata, a decisão do TC parece-me justa e acertada no que diz respeito ao principio da igualdade. Como defensor do Estado de Direito, fico contente de o primado da justiça se ter sobreposto ao primado da economia. Como ignorante em Direito, não entendo como é que se permite que se mantenha algo que é ilegal. O ano passado fez-se um orçamento rectificativo para ajustar uma execução orçamental que já estava em curso. O TC teve medo de ser acusado de ser o responsável pelo incumprimento do déficite de 2012. Como keynesiano,não vejo como é que a austeridade pura e dura e depois de desmantelado o tecido produtivo relança a economia. Acho que os liberais também já estão com dificuldade de ver. Como pessimista, estou convencido que a espiral recessiva vem aí. A espiral, porque a recessão já cá está. Como cidadão que não tem experiência em futurologia, não sendo portanto licenciado na matéria, não vejo como é que se sai disto. Como invejoso, invejo tanta gente com tantos saberes que nos apregoa hoje uma coisa, amanhã outra, e cada vez o fundo vai mais para baixo. Sim, porque quando batemos no fundo, o fundo desce.

01 julho 2012

Portugal pós-moderno

No Portugal pós-moderno quem falha os cálculos e objectivos é bom aluno; quem mente para ganhar eleições, depois, na pós-modernidade, apresenta-se como o paladino da credibilidade do pais; antigamente, explicava-se a estatística exemplificando se uma pessoa come um frango e outra come nenhum, em média come meio frango cada uma, no pós-moderno, se uns quantos dão um rombo de nove mil milhões de euros num banco, em média todos os portugueses estão a viver acima das suas possibilidades; antigamente, uma grávida dizia que estava grávida, não estava doente, hoje o subsídio de maternidade é reduzido para ser equiparado ao subsídio de doença; outrora, havia ministros, hoje, só há álvaros; no pós-moderno, enquanto o Estado assume as dívidas de baronetes da política, as famílias que devem a prestação da casa entregam-nas aos bancos; antes havia desempregados, hoje um milhão e duzentos mil oportunistas; na pós-modernidade, deve existir o espírito empreendedor, todos devemos fabricar bonequinhos de barro, patchworks e frasquinhos de compotas para vendermos uns aos outros; no pós-moderno, um governante não erra, é surpreendido pela realidade, nem, tão-pouco mente, tem lapsos; antes, havia um Presidente da República, hoje, um reformado de magra pensão.
Ontem, havia memória das coisas, no pós-moderno, apenas uma vaga ideia.