18 março 2011

A maior Lua cheia e a maior crise financeira

Amanhã será visível a maior Lua cheia dos últimos 18 anos. Aparecerá 14% maior e 30% mais luminosa.
Em que medida, a olho nu, será capaz o ser humano de detectar estas diferenças relativamente às habituais luas cheias? Provavelmente a diferença será indetectável e o comum cidadão contentar-se-á, se se lembrar de olhar o satélite terrestre, em dizer que viu a Lua num dia especial.A maior Lua cheia não terá quaisquer consequências na vida das pessoas, a não ser que nessa noite apreçam mais ou maiores lobisomens do que noutras noites da mesma fase da Lua.
Idêntica é a posição do observador em relação à governação do país - a mais luminosa execução orçamental -, e à actuação do Presidente da República e partidos da oposição - da maior responsabilidade política: não consegue detectar como sair da maior crise económica e financeira dos últimos 18 anos (para utilizar o mesmo período de tempo aplicado ao satélite da Terra). Quanto aos lobisomens, no que à crise se refere, eles andam aí aos magotes e não precisam de especial posicionamento da Lua para actuarem.

17 março 2011

O problema de Portugal é...

O problema do Eng.º José Sócrates e do PS já não se prende com o facto de ter ou não razão e de que as medidas orçamentais que aplica e outras que pretende aplicar são as correctas para evitar a intervenção de instituições financeiras estrangeiras. O problema do Primeiro Ministro é que já não consegue acalmar os mercados e só consegue sobressaltar os portugueses.

O problema do Dr. Passos Coelho e do PSD reside exactamente no mesmo facto, embora destes não se conheçam com clareza as soluções alternativas para tirarem Portugal desta situação. O problema do líder do PSD é que, segundo as sondagens, não existe uma garantia de uma composição da Assembleia da República que permita a formação de um governo salvífico. E tal perspectiva não desponta no horizonte porque a situação de angústia dos portugueses

O problema do Presidente da República não é se tem nas mãos um dos mecanismos para provocar eleições antecipadas e se o deve usar. O problema do Prof. Cavaco Silva é que, devido às razões apontadas acima, a utilização desse mecanismo não é garantia de coisa nenhuma e poderá ficar na História como o Presidente que sabia de Economia, mas não foi capaz de politicamente ser origem da resolução do caos económico e financeiro de Portugal.

O problema dos portugueses não é se a solução passa pelo PS, PSD, Presidente da República ou outros quaisquer. O problema dos portugueses é se conseguem aguentar, e como, até à resolução da crise.

15 março 2011

"Nu au plateau du sculpteur", de Pablo Picasso

O quadro mais caro do mundo, "Nu au plateau du sculpteur", de Pablo Picasso, pertencente a colecção privada, está em exposição na Tate Modern, em Londres.
O quadro apresenta a amante e musa do pintor e custou 76 milhões de euros em Maio do ano passado.
Definitivamente as amantes sempre foram consideradas um luxo caro.

14 março 2011

"Berlin Alexanderplatz", de Alfred Doblin, D. Quixote

A manifestação da "Geração à rasca" já foi suficientemente divulgada e debatida pelos inúmeros comentaristas mediáticos. Do que vi, ouvi e li havia um ponto em comum: o protesto expressava a angústia quanto ao futuro(que é já hoje), não dos jovens sem emprego, com contratos precários, falsos recibos verdes..., mas de todas as gerações. A geração do meio, incluindo aqueles que estão empregados, está aflita. Muitas famílias têm de sustentar três gerações (que segundo o paradigma de organização de sociedade actual deveriam ser economicamente independentes), a sua própria, a dos filhos que já deveriam ter ingressado no mercado do trabalho, e a dos pais com reformas de miséria, utilizando uma expressão bem conhecida, mas que começa a tornar-se numa grande verdade e não apenas numa palavra de ordem.

No entanto, o modo como se desenrolou o protesto deu-me algum conforto. O ar festivo, de happening, moderado (a manifestação dos professores de 2009 exalava muito maior agressividade), o retorno à (infeliz normalidade) após o encontro, deu-me o conforto de pensar que a crise, se se faz sentir duramente na carne, ainda não corroeu a alma do povo.

"Berlin Alexanderplatz", romance de Alfred Doblin, O romance relata a vivência de um operário (desempregado), Franz Biberkopf, em 1929, na Alemanha, durante a República de Weimar que desembocou no nacional-socialismo. O autor descreve de forma soberba, quer literária (já alvo de muitas análises, incluindo a de Walter Benjamim, hoje tão divulgado), quer sociológica e psicológica, o que pode acontecer a um povo quando o desgoverno da economia mina até ao tutano os alicerces de uma sociedade. A escrita é dura, duríssima, de uma crueldade ímpar, mas só assim se consegue transmitir a dureza e crueldade de vidas para as quais muitos são empurrados sem possibilidade de fuga.
Algumas análises ao romance dizem que o verdadeiro protagonista do livro é a cidade e principalmente aquela praça, Alexanderplatz, sempre presente como elemento opressor, como um espaço ao qual Bierkopf está confinado, ou ao qual tem sempre de regressar. E a praça e todos os espaços são habitados pelo lumpen, pelos marginais à força.
Quem ler hoje o livro pode fazer uma extrapolação entre a crise de 1929 e a crise actual e sugerir que o verdadeiro protagonista não é a praça, mas a economia sem rumo que nos oprime, procurando-se a solução dentro do mesmo esquema económico que nos confina.
"Berlin Alexanderplatz" é um livro de fôlego (mas não se lê de um fôlego, pelo menos eu), é precisa uma grande resistência e capacidade de sofrimento com a miséria humana para o ler.

Haja esperança que a praça dos Restauradores nunca seja uma Alexanderplatz de 1929.