23 dezembro 2011

HISTÓRIA DE NATAL

Eu queria escrever uma História de Natal como eram todas as histórias de Natal da minha infância. Daquelas que acabam com os ebenezers scrooges desta vida atarantados, cheios de medo e convertidos à solidariedade humana.
É preciso dizer que a minha infância durou até tarde, até pr' aí aos cinquenta anos. E só então me dei conta que a parte fantasiosa do Conto de Natal de Dickens, não eram as aparições dos Natais Passado, Presente e Futuro, era mesmo a conversão do Scrooge em ser humano de bons sentimentos e bom coração. Já não se fazem scrooges como o da história. Os scrooges de hoje entram-nos casa dentro com ar compungido dizendo que o Natal tem de ser duro porque andámos a celebrar natais à grande; os scrooges actuais não aumentam o ordenado como no conto,dizem antes que os portugueses têm de trabalhar mais horas e retiram-lhe parte do salário.
Neste Natal multiplicar-se-ão os Bob Cratchit (o rapaz da história de Dickens), só que em negativo: em vez de terem um Natal melhorado, tê-lo-ão abaixo das suas expectativas. Os pais vão avisando, Este ano é só um brinquedo pequenino, mas invariavelmente a esperança de ver o presente almejado só morrerá à meia-noite de 24 de Dezembro, ou no dia 25 de manhã. Enquanto a desolação se dever à diminuta dimensão do brinquedo, não será assim tão mau. O pior será o comer da ceia de Natal, condimentado com as lágrimas dos pais, porque no resto do ano, a labuta para pôr o pão na mesa afigura-se inglória.

A minha História de Natal preferida não é a de Dickens, é a de um Menino que nasceu sem nada, se fez à vida e se fez Homem, e que bem ou mal se tornou símbolo de uma grande parte da humanidade. Não consta que, nos seus 33 anos de vida, alguma vez tenha celebrado o Natal, mas compartiu o pão e o vinho, multiplicou os peixes e tornou-os alimento do espírito; não há mesmo relatos de que tenha celebrado o dia de anos, mas histórias existem de que protegeu os fracos e indefesos e acusou os poderosos.
Esta é a História que me dá ânimo, dizendo-me que se procedermos como o Menino, os natais futuros serão bem melhores sem ser necessária a caridade dos ebenezers scrooges.

Eu queria contar uma História de Natal, mas a original é a melhor de todas. Tudo isto é inventado, e do domínio da crença. Pode ser, mas terminada a minha ingenuidade da infância, deixem-me prolongar a da adolescência.

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