26 abril 2011

Peço desculpa, mas não me culpem da crise financeira e política

Até ontem, até ao final da alocução do Dr.Jorge Sampaio nas comemorações do 25 de Abril, também eu declarava que todos éramos responsáveis pela situação de crise em que o país se encontra. Cada um com o seu quinhão e em dimensões diferentes, mas todos concorrendo para uma culpa comum. No entanto, na mais pura tradição da cultura/formação cristã e do pecado original com que todos vimos ao mundo numa insanidade de assumpção de culpas mesmo antes de ter consciência do próprio ser e que nos predispõe à aceitação de castigos que não merecemos, este pode ser um discurso anestesiante. É é-o porque distrai das verdadeiras causas da situação remetendo para a sombra as soluções necessárias, porque castra a contestação justificada e razoável que mantém sociedade e os governantes em estado de alerta, porque "privatiza" culpas passando-as em parte aos cidadãos.

Não podem ser culpados os portugueses de viver acima das suas possibilidades quando a sua maior fatia do seu endividamento é a da habitação porque não há mercado de arrendamento; não podem ser responsabilizados pela crise os desempregados da empresa que recebeu subsídios para se instalar em Portugal e depois fecha, sem penalização, para deslocalizar para países de mão-de-obra mais barata; não podem ser culpados o portugueses pelas ofertas de crédito fácil promovidas pelos bancos feitas a eito e sem critérios de risco; não podem ser culpados por se permitirem pagamentos a 60 e 90 dias (forma de crédito junto dos fornecedores) que sufocam milhares de pequenas e médias empresas deteriorando o tecido produtivo; não podem ser culpados que eventuais actos do foro criminal no BPN e BPP pusessem em causa o sistema financeiro; não podem os portugueses ser culpados de uma crise política para a qual não foram chamados; não podem etc, etc...

Sem dúvida que cada um de nós poderia ter feito melhor, é sempre possível fazer melhor, sobretudo não nos demitindo de participar activamente nos destinos do país e limitando-nos a entregar de quatro em quatro anos (muitas vezes menos) esse destino ao partido A, no partido B ou em A+B.

Peçam-me que contribua, peçam-me que sofra, peçam-me que morra pelo meu país, não me peçam que assuma as culpas que não tenho.

1 comentário:

  1. Delicio-me a ver da janela do meu apartamento aviões cheios de reformados de 300 € por mês a voarem para férias nas caraíbas; entusiasmo-me com aquele pedinte a quem dei uma moeda de 50 cêntimos e que me disse, obrigadinho assim já posso dar para entrada de um apartamento na Reboleira, entusiasmo-me ao ver aquela senhora, que até já foi secretária na minha empresa a comer uma sopinha ao balcão do Farol e a dizer-me, olha pá estou a viver acima das minhas possibilidades, mas tem de ser, Prefiro gastar 2,5€ numa económica do que andar aos caixotes. Por acaso ainda lhe disse, isso não se faz, devias era dar os 2,5€ ao Oliveira e Costa, mas ela nem sabia quem era o gajo. Mania de vivermos todos acima das nossas possibilidades.

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