14 março 2012

BONECA DE LUXO, Truman Capote, Dom Quixote

Truman Capote publicou Boneca de Luxo em 1958 e seria hoje uma hoje uma história banal e trivial: uma rapariga,Holly Golightly, há pouco saída da menoridade, vinda de uma infância débil, abalança-se no mundo munida da sua beleza e do seu corpo, com o único intuito de planar acima das agruras do dito mundo - um dos maiores prazeres seria um pequeno-almoço no Tiffany's.
Uma noveleta, como lhe chamam os brasileiros, em que Truman Capote começa a aplicar a sua grande invenção, no dizer do próprio: o romance de não-ficção. Boneca de Luxo é uma história sem fim à vista em que o candidato a escritor, Paul, nos seus encontros com a rapariga, vai desvendado o passado, que determina os anseios de presente e de futuro de Holly.
Tida como uma história de amizade de um homem, desinteressada de outros interesses, por uma rapariga pela qual os homens só se interessam pelo prazer da carne, Capote veste Paul(ou é mesmo o autor que não se despe)da sua profissão de jornalista e a noveleta constitui-se num percurso de uma visão jornalística à cata dos factos, dos como e dos porquês de uma vida marginal.
Truman Capote escreveu sobre vidas marginais, possivelmente na tentativa de perceber a sua própria marginalidade, porque Capote deixa transparecer da sua obra, e dos relatos da sua vida, que a sua marginalidade não é um resultado da natureza ou do destino, mas uma questão de opção. Se hoje Boneca de Luxo seria uma história banal, à época foi ela própria uma obra marginalizada e assaz controversa, passada a cinema, três anos depois, numa versão muito benévola, em que Capote pretendia que Marylin Monroe fosse a protagonista, o que foi recusada por haver uma grande identificação entre Marylin e a prostituta Holly (conclusão do autor destas linhas. Daí também que a obra não seja assim tão ficcionada).
Truman Capote percebeu que a atracção, dos normais, pela marginalidade não é o que se conta dela, mas o que se deixa no ar sem ser dito: o prazer da diferença, a transgressão aos códigos éticos e morais, a sensação de liberdade. E paradoxalmente, ou não, o marginal consciente, como Truman Capote é um prisioneiro porque só é feliz se os outros se espantarem com, ou admirarem, a sua marginalidade.

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