26 maio 2012

CÃO À RODA ATRÁS DA CAUDA

Diz o filosofo José Gil que depois do 25 de Abril dos três espaços de intervenção e discussão - o político, o público e o da comunicação social - o único que não foi ocupado e utilizado por quem de direito foi o público. Avanço que esse espaço foi tomado, primordialmente, pela comunicação social; acrescento que a política se apropriou também deste espaço através da trânsfuga de políticos no activo ou em banho-maria de cargos partidários e políticos para escribas, comentadores e painelistas dos media. Tropeçamos neles a todo o momento e instante, é o discurso redondo: muda o cenário, da Assembleia da República ou da sede partidária para o canal televisivo, e são os mesmos a falar e a opinar, e a repetirem-se incessantemente sem se cansarem. E não há escapatória possível, sempre os mesmos, nas televisões, nas rádios e nos jornais. A acumularem o comentário e debate político com a opinião sobre as mais diversas e dispares matérias, especialmente futebol, estendendo a sua omnipresença a tudo o que mexa na comunicação social. O desemprego não é preocupação de ex-líderes partidários e outros políticos, pois sabem que terminadas as funções, se ainda não tinham, serão convidados a ter o seu espaço-público/político no espaço da comunicação social.
E existem ainda, aqueles que sendo políticos - não confundir com funcionários da política -, tratando até a política com algum distanciamento, há anos que formatam o pensamento vigente. Há quantos anos ouvimos e lemos Pacheco Pereira, Vasco Pulido Valente, Marcelo Rebelo de Sousa, etc., etc.? Não está em causa a sua capacidade, competência, inteligência, só que, voluntária ou involuntariamente, castraram a renovação, imaginação, ruptura, clivagem, rasgo. E os novos que entram já pertencem ao clube.
A informação/opinião com que o espaço comunicação social deveria alimentar o espaço público é mais filha do espectáculo do que do valor intrínseco da informação. Os debates, quer parlamentares, quer televisivos, têm tanto maior audiência quanto mais elevado for o grau de divergência e de agressividade dos participantes. A novidade da notícia é factor a ter em consideração, mas a importância opinativa que os tais políticos-comentadores/jornalistas-comentadores lhe vão dar é que a tornarão efectivamente relevante.
Se aplicarmos este discurso à área da cultura os tiques do sempre os mesmos repetem-se, só que num mundo mais restrito, onde o cidadão comum delegou completamente competências na comunicação social e críticos alheando-se da sua natureza de opinador e interveniente, quedando-se pela de consumidor da corrente dominante.
O espaço público de opinião e de actuação está pois contido, domado, domesticado, dentro da lógica de um sistema que se perpetua e que é difícil de quebrar, mas não é intransponível. Raros são os casos de poderes instalados que desistem ou cedem parte do seu poder por vontade própria e a culpa será, também, dos cidadãos que não reivindicam e ocupam o espaço que lhes pertence, mas que faz falta uma lufada de ar fresco, isso faz. Porque uma sociedade que não renova o pensamento está destinada a definhar.

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