10 junho 2011

O meu encontro com Stanley Kubrick

Diz o Público de hoje que 2011 é o ano em que compreendemos Stanley Kubrick. E a propósito desta chamada de primeira página recordo um episódio que tive com este realizador.

Travei conhecimento com Stanley Kubrick em 1968 aquando da estreia de "2001: Odisseia no Espaço" e é este o filme que mais vezes visionei: três vezes no cinema e depois na televisão e em DVD.
Se tivesse de escolher dez filmes para levar para uma ilha deserta seria este um dos filmes seleccionado? Julgo que depende dos dias. Então, porque o visionei tantas vezes?

Em 1968, vivíamos em ditadura e andava eu no Liceu de Camões cujo reitor, Dr. Sérvulo Correia, era denotadamente pró-regime e instaurador de uma disciplina férrea neste Liceu consentânea com a ideologia do Estado Novo. Uma coisa eu agradeço ao Dr. Sérvulo Correia: escolhia os melhores professores para o seu Liceu independentemente das convicções políticas ou do seu estilo de ensino (só lhes exigia que fosse de excelência). Por esse motivo tivemos muitos professores que nos puseram a pensar para além dos limites da escola e dos programas oficiais.

Entre os professores do pensamento tivemos um padre na disciplina de Religião e Moral (cujo nome infelizmente não recordo) que nos aconselhou a ver o 2001 e disse (nunca me esqueci): fala de Deus, e provavelmente vai ser censurado. Na ocasião fui vê-lo mais pela segunda razão do que pela primeira e quando o vi não percebi nenhuma das duas. Em abono da verdade, ao primeiro visionamento a decifração foi bastante difícil e muito do deslumbramento terá ficado pela espectacularidade das imagens (a cena do macaco a descobrir uma arma)

Depois de um número significativo de alunos ter visto o filme, o professor de Religião numa das aulas disse: vamos discutir o filme. E falámos abertamente, do que quisemos, sem peias, sem restrições, sem medo de dizer asneiras. E o padre em vez de dar a sua sentença como verdadeira ia-nos orientando na discussão e no fim resumiu: o filme fala do homem na sua dimensão cósmica, de onde veio e para onde vai (mais ou menos isto).
Aí, nós, os alunos, detectamos a incoerência de uma das razões iniciais e em uníssono (liberdade de escrita): o senhor padre disse que falava de Deus. E, lembro-me, que retorquiu: falar do Homem, é falar de Deus.

Tentámos apanhar o padre em nova contradição e recordamos que nos tinha dito que o filme provavelmente iria ser retirado de exibição e que o mesmo continuava impávido e sereno em cartaz. Respondeu: os censores não detectam as ideias de liberdade quando elas são mais visíveis.

O Cinema Monumental ficava a dois passos do Liceu de Camões. Nesse dia, sai das aulas e foi comprar bilhete para ver o filme pela segunda vez. Desta vez o deslumbramento foi total porque com os ensinamentos do professor e as opiniões (que são também ensinamentos) dos meus colegas e, sobretudo, com a capacidade intelectual a trabalhar, descodifiquei o filme. Talvez por isso seja o filme que mais vezes vi e quando penso em Deus e na Liberdade: "2001: Odisseia no Espaço"

1 comentário:

  1. Sendo vc amante da 7a Arte e entusiasta de 2001 de Stanley Kubrick, estou certo de q vai gostar destes clipes editados por mim os quais evidenciam uma curiosa sincronia entre o filme e a 5a Sinfonia de Beethoven:

    http://www.youtube.com/watch?v=AmQPTSfE1kM

    http://www.youtube.com/watch?v=NihSprngqhE

    Congruências Cósmicas ou um fruto oculto do preciosismo técnico do diretor, o importante é q é DIVINO de qualquer forma!

    Tratando-se desse filme, não se trata propriamente de quem explica melhor, mas de acrescentar os questionamentos + relevantes a tudo q já foi e continuará a ser dito sobre 2001.

    ResponderEliminar