17 junho 2011

I - O Socialismo Democrático está moribundo. Será verdade?

1- Nos últimos trinta anos tenho sido intermitentemente assaltado por alguma angústia derivada a factores exógenos, mas que me despoletam este estado de alma. E isto porque sempre que um qualquer Partido Socialista perde eleições, e particularmente em Portugal, aí estão elas, levantam-se as vozes a decretar o fim, a agonia, a extinção, a encruzilhada, os impasses, as refundações, os repensamentos da esquerda e da Filosofia Socialista. Ao contrário, sempre que a direita perde, perde acabou-se, para a próxima ganha.
Percebe -se a minha angústia: a morte do sistema sócio-político no qual me revejo significa a minha orfandade ideológica.

Vasco Pulido Valente nos primórdios da Quadratura do Círculo, na TSF, atirava-se a José Magalhães, ainda do PC, dizendo que não havia nenhum país do Mundo onde o modelo engeliano/marxista funcionasse; depois de 5 de Junho escreveu o mesmo sobre o socialismo democrático: acabou-se. Esquece-se de dizer que o sistema liberal ou neoliberal também não funciona em local nenhum do Mundo.

Francis Fukuyama que decretou o fim da História (de um modo simplista, significa o fim das ideológicas), porque o capitalismo tinha triunfado, passados uns anos "pediu desculpa" porque se tinha enganado. Nunca me atraíram os pensamentos de Fukuyama, mas quem se retrata desta maneira merece toda a simpatia e credibilidade intelectual.

2 - Então, andamos na Terra a fazer o quê? A inventar modelos fantásticos que não têm aplicação prática?

Todos os modelos de sociedade têm uma base filosófica, nascem da Filosofia e não da Economia. A Filosofia não busca soluções e certezas, busca o esclarecimento e a clarividência;a
Filosofia só tem vida, só progride na dúvida, nunca na certeza. A Economia Política (o modelo
económico)só comprova quantas mais certezas tem (quantas mais vezes acerta).

Numa frase, e para a prossecução do raciocínio: o Socialismo Democrático e a Social-democracia, que muitas vezes significam o mesmo, consideram o indivíduo imbuído e instituído de um amplo leque de liberdades como um contribuinte (má palavra esta, brrr) para o colectivo; o liberalismo considera o colectivo como o contribuinte do desenvolvimento (sobretudo económico)do indivíduo.
Não consigo ver, nem quem tenha visto, a morte de qualquer destas premissas filosófico-ideológicas destes dois modelos, porque não são as falhas dos modelos económicos que levam à renegação da filosofia/ideologia que lhe subjazem.

As ideologias totalitárias não são admissíveis porque têm modelos económicos iníquos, mas porque pretendem a anulação do individuo desprovendo-o das suas liberdades.

Mas se nenhum dos modelos de sociedade tem aplicação prática na sua plenitude, devemos aderir a um ou a outro por exclusivo fervor clubista?

Talvez não. Se pensarmos, os valores Éticos e Morais da sociedade no que respeita aos direitos e liberdades dos indivíduos têm (através da Filosofia) vindo a ser apurados e a serem transpostos para a realidade através de actos de discriminação positiva, legislação, assumpção de valores, e muitos deles são já naturalmente aceites. Mais que não fosse, a dignidade humana e a sua defesa são motivo suficiente para que gastemos algum tempo a pensar bem que tipo de sociedade pretendemos construir e legar a gerações futuras.
(Nota: diz-se com ironia (ou, talvez, não) que os liberais aceitam a igualdade económica e social das mulheres porque assim se alarga o número de agentes do mercado).

Mas o respeito pelo indivíduo não é também apanágio dos liberais e dos democratas-cristãos?
É. E a Democracia-Cristã até mais do que o liberalismo. Quando Paulo Portas disse que em determinados aspectos estava à esquerda do PSD das duas uma: ou foi oportunismo político, ou sabia do que estava a falar.

Então, o porquê da opção pelo Socialismo Democrático, ou Social-Democracia:

a) Parte de indivíduo para o colectivo, nunca o colectivo podendo viver sem que na sua base estejam todos os indivíduos;

b) A Ética e a Moral, com a sua tradução prática nas liberdades, nos direitos e nos deveres do indivíduo são a base do pensamento filosófico-ideológico. O Estado é o garante e não o impositor dessas liberdades, a Lei e a Ordem são um meio e não um fim.

c) A Política condiciona a Economia, não o contrário;

d) O Estado não é a Política, é um dos instrumentos desta.

Poderá alguém, alguma vez, decretar a falência destas ideias baseado apenas em derrotas eleitorais? Parece-me bem que não. Pronto, já me passou a angústia.

(continua: "II - É viável o Socialismo Democrático com o PS?")

(Nota: Para eventuais comentários, sempre bem-vindos: este texto não é exaustivo. Em blogs não se pretendem fazer tratados de Filosofia, Política ou Economia)

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